5/19/2010
Banho selvagem
Perdi minha alma na mata. Tomo banho com fantasmas na floresta branca. O musgo úmido desta banheira de lamentações.Esta aliança em chamas.Pouco néctar, muitas contas. Chove sobre minha face janela.Eu quero um lugar entre a neblina. Poder não conviver com gosma de barata morta.Uma lagoa de pétalas secas. A barraca nesta montanha de fé.Muitas palavras cortadas, cobradas, alavancadas simplesmente pela formalidade.Eu tenho um coração na mão cheio de feridas e traças.Um relva de prantos, decepções, sonhos que derretem ao primeiro muro.Estou com o escudo, mas a flecha se perdeu no meu olhar.Lavo todo o cupim do piso, encero a madeira com cravo.Estou na torre movediça.Ora no céu, ora atirada em alto mar.
Eu tenho medo sempre do último passo.
Nunca do primeiro.
*Foto sobre a performance de Janine Antoni
5/12/2010
Liana Keller
Como fazer poesia com humor?
Não conheço a Liana, mas sou apaixonada pela maneira que ela escreve sobre o cotidiano poético. É síntese, beleza e humor. Sem falar de como ela consegue nos colocar na situação, compartir junto o " it" do momento. Amo!
"brinde"
eu descia a consolação.
foi então que vi uma senhora que vendia cafézinhos e afins junto ao murão do cemitério.
parei,pedi um café puro.
logo,apareceu um morador de rua ao meu lado.
e disse:"-ó,se não quiser dar,não é obrigada...não precisa...maaaas...pode me pagar um cafézinho??"
eu:"-cafézinho?"
ele:"-sim."
eu:"-um café para ele,por favor."
ela serviu-o.
ele ficou contente.
sorriu.poucos dentes na boca.
sorriso sincero,aberto.
sorri em resposta.
foi aí que ele ofereceu um brinde:
"-ao dia do seu casamento!você será muito feliz!"
*
www.lianatrapo.blogspot.com
Não conheço a Liana, mas sou apaixonada pela maneira que ela escreve sobre o cotidiano poético. É síntese, beleza e humor. Sem falar de como ela consegue nos colocar na situação, compartir junto o " it" do momento. Amo!
"brinde"
eu descia a consolação.
foi então que vi uma senhora que vendia cafézinhos e afins junto ao murão do cemitério.
parei,pedi um café puro.
logo,apareceu um morador de rua ao meu lado.
e disse:"-ó,se não quiser dar,não é obrigada...não precisa...maaaas...pode me pagar um cafézinho??"
eu:"-cafézinho?"
ele:"-sim."
eu:"-um café para ele,por favor."
ela serviu-o.
ele ficou contente.
sorriu.poucos dentes na boca.
sorriso sincero,aberto.
sorri em resposta.
foi aí que ele ofereceu um brinde:
"-ao dia do seu casamento!você será muito feliz!"
*
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5/08/2010
Irôko*
IROKO
Corri passo ar passo ar passo ar passo ar passo.Ofegantes braços grandes de Irôko. Uma ladeira: limo e chuva. Dois pés, 500 metros até Irôko: a casa da alma. Árvore que fala. Os braços da Figueira para o alto. Machucados. O interior do tronco: desenho sobre raízes que brotam. Ondas de madeira atlântica. Canto úmido dos pássaros desabrigados,esquilos com fome, formigas a enfeitar a entrada da seiva, selva interior.Sobre o rosto de Irôko a terra roxa, a lágrima e a sombra.Galhos altos, pesados. Fincados na ladeira da inclinação.Passeio as mãos nos pés do povo-em-pé.Acaricio a pele da árvore, transpiro.Deixo lá um pouco do meu suor. Choro sobre as raízes-feto de Irôko. O corrimão da escada para o céu é áspero.Lavo o corpo: minha pele é de crocodilo.Ouço o tintilar de um búzio.Desejo escalar Irôko. Morar na sua neblina,na sua passagem de anos, seus galhos calvos, suas rugas-mapas, sua firmeza branca.
Que há além do caminho mais alto
do último galho?
5/03/2010
Morro do Palácio - Rio de Janeiro
Pior é solidão invertida. Cheiro de barro e cerveja nas calçadas.Crianças acordadas no som da buzina e gargalhadas. Quatro horas da manhã. Não posso olhar a janela. A casa não pode ser rebocada. É necessário não desejar as mulheres.Sobre os homens ninguém falou. Perco a escrita porque é necessário limpar os restos da festa. Completar o mármore do banheiro, concertar a caixa d água. Tapá-la. Os canos escorrem furados e escassos, livremente a pouca água acaba no caminho dos 169 degraus contados até o descanso. Uma semana no morro do Palácio. Praticando a vida da comunidade, partilhando intimidades e desconhecidos.Famintos. De lá pude ver a ponte. De lá, tive vontade de jogar a caneta fora para abraçar o tambor. A negra cor tão necessitada de pérolas, prismas e diamantes.Mas aqui é só futebol e carnaval,
além da bala.
Eu tenho algum sorriso para dar?
Vejo o mundo como a minha casa.
E você?
Fotos: Giorgio Filomeno
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