Na loura madrugada
o prazer impregnado
no batuque
cachoeira sobre o corpo
Na madrugada sonhada
tudo se refaz
medo se desfaz
e permanece
Tua presença é luz
cintilando em minha pele flor
saltitando o meu pulsar
recriando meu tesão
Tua voz
harmonia perfeita
puxando meu samba
carnavaleando
meu prazer
Na loura madrugada
tua presença é luz
cintilando minha pele flor
Prazer impregnado
no batuque
saltitando o pulsar
recriando meu tesão
Na madrugada sonhada
cachoeira sobre o corpo
banha alma
o medo me desfaz
e o desejo me lateja
onde é que festeja
sem latejar
tua presença?
Na doce madrugada pagã
tua voz é perfeita harmonia
em excitante cadência
repuxando o samba em mim
em mim
carnavaleando o prazer
3/28/2007
Revoa
Pra tudo
tem uma segunda chance
você me bateu
eu te arranhei
você rasgou
minha coleção
de folhas secas
você arrancou o único botão
da minha blusa
você me jogou no chão
e eu te bati
você puxou meu tapete
e eu puxei sei cabelo
você gritou comigo
e eu murmurei
com raiva
você me assustou
eu te denegri
você bebeu o meu veneno
e eu escondi o antídodo
Mas se
nos esbarramos
intimamente
no silêncio
de nossos sonhos
estivemos perto demais
se dói em mim
dói em você
porque pisamos
na alcova
um do outro
porque dividimos
a mesma asa da borboleta
porque fomos
juntos e unos
muito convictos
do não
porque apontamos
para o mesmo caminho
porque dividimos
o mesmo reflexo
no rosto parado das águas
porque de áspera e ânsia
tem uma segunda chance
você me bateu
eu te arranhei
você rasgou
minha coleção
de folhas secas
você arrancou o único botão
da minha blusa
você me jogou no chão
e eu te bati
você puxou meu tapete
e eu puxei sei cabelo
você gritou comigo
e eu murmurei
com raiva
você me assustou
eu te denegri
você bebeu o meu veneno
e eu escondi o antídodo
Mas se
nos esbarramos
intimamente
no silêncio
de nossos sonhos
estivemos perto demais
se dói em mim
dói em você
porque pisamos
na alcova
um do outro
porque dividimos
a mesma asa da borboleta
porque fomos
juntos e unos
muito convictos
do não
porque apontamos
para o mesmo caminho
porque dividimos
o mesmo reflexo
no rosto parado das águas
porque de áspera e ânsia
a vida revoa
até uma folha
e foi tudo muito sentido
para não ser real
a vontade de voltar
até uma folha
e foi tudo muito sentido
para não ser real
a vontade de voltar
vol
ta
nem que para uma segunda
vez
da primeira
*Lygia Pape
3/27/2007
*Ana Mendieta
Você pediu, com muita doçura que eu observasse o céu e olhasse o prazer das gaivotas sentindo o vento. Com seu sorriso você me pedia muita esperança. Mas ontem quase não levantei da cama, mas ontem eu quase fiquei no escuro sem acender a luz. Mas ontem, ontem me tirou o sol de hoje.Foi isso. E enquanto você pede e tem certeza da luz que entra pelas janelas, eu fecho a coritna e choro com medo de mais nuvens.
Dos olhos
Seus dois olhos diante de meus dois dor-olhos. No seu, havia duas lanternas verdes. No meu, dois últimos túmulos, duas margaridas murchas e uma nesga de fé. Que de encontro ao teu mar-olho ficou com vergonha e chorou.
O brilho da verdade*
Cura. Em alguns tons, ela se dissolve em leveza e asasde borboleta; em outros, vem da cachoeira daslágrimas, separações de corpos, sonetos rasgados,contratos assinados. Ela é a altura da queda. Esclarecida por serinteiramente, a cura é a verdade que brilha. Mesmo que ela traga em seu histórico confissões, dores,palavras-buraco, ausências e a foice. A cura é o corte. São aqueles dois braços olhados, percebidos de veia, força e verdade.Toda coisa verdadeira traz consigo um pouco de húmus,restos, sementes, túmulos, tempestades, alvoradas. A alvorada é como uma cura, um suspiro depois do cansaço.
A poesia de Enzo não finge um sorriso, não acena uma ida. Ela atravessa o interior da fruta e cospe ocaroço. Não é uma estrela brilhante por natureza, é uma estrela que percorreu todo o redemoinho da dor para chegar à luz.Quem nunca mostrou o corte da ferida, não pode descobrir o remédio. Quem não se rendeu à poesia de um velho pneu furado, não pode contemplar a via Láctea. Não pode porque a beleza é o que cintila e colore dentro da verdade. A poesia de Enzo é uma das mais belas reuniões de verdades. Não veste máscaras. Devolve ao cruel apontar de dedo social, o âmago da realidade que vivemos. E por que afinal estamos em meio a resíduos de nós, ao invés de todos estarmos embrenhados nas florestas da Cura?A verdade está na bolsa dos escafandristas; a verdadenão tem medo de cortar porque ela sabe que a faca apesar de cortar, pode acariciar a forma e desenhar embalos de mães.A verdade é tão dolorida que purifica, é cavada comtanta intimidade que purifica. Mesmo suja e cinza como o céu de Afeganistão, a verdade voa. Mesmo incrustada de sentimentos e vazios, mesmo oculta de medos e rasgos, a verdade voa. “Pois até os urubus são belos nos largos círculos dos dias sossegados”-CecíliaMeireles.
A poesia de Enzo remove a camada dos remotos adereçoshumanos. Revela, fere, aponta, mas também beija,acalma, entristece e dorme. É a vida do caos. Não entra de mansinho. Invade o quarto, afinca a terra,estia a bandeira, arranca a costura e deixa o trapo.Deixa a tempestade sem passar, deixa a tempestade e o barco dançarem.Como na obra de Turner, toda a sua aflição, todo o seu testemunho sobre fantasma, sobre nosso lado mais penugento. As palavras vivas de “Cura” não mimam, não cuidam, não adocicam. Apenas removem as amarras e couraças do mundo e revelam. Revelam aquilo que todos nós precisamos ao menos perceber, chegar perto e sentir. Mas isso não significa sentir prazer. A revelação de algo em nós é tão surpresa, que nos treme inteiros.
-Texto para o Prefácio do novo livro de Enzo Potel intitulado de "Cura"
3/07/2007
Rio do Choro
Chorei um choro leve
de quem carrega a vida
sem pressa
algo como um sonho
bobo de você
sonhei um choro
exausto
que sumia ao largo
da estrada
chorei teu choro ofegante
um tango
chorei um choro por ti
pra te matar no escasso
de um amor virado
Ao pé do redentor
minhas lágrimas
em véu
Chorei a pronúncia
de uma
grande lácrima
que muito arriada
vira um rio
sem foz
Imorais
O bicho do lobo homem
suicidou
No buraco que caíste
puxaste meu amigo
esse que pára
no ar
pára-paira
O doce do musgo carvalho
meu amigo é um beija-flor
existe pela própria
primitiva existência
cria
bate asas vezlozmente
mais que você
mulher-buraco
Ele
que enquanto o mundo grita
e a morte emudece
despe-se da rispidez
Ele
que com a bravura
da leveza
arranca a roupa
do luxo-consumo
e remove
a camisa do medo
Ela
que mostra
o cárcere
a fim de dar a flor do ânus
para o mundo
Ela
que
sorri
no seu
ânus
ônus
flor
Ela
que livre da morte
é somada a tentativa
de golpe
pela imoralidade
de outrém
(para o ele que é ela e vice versa)
Hilda Hilst
" A solidão tem cor, é roxo escuro e negro..é como se você fosse andando...uma vasta planície, vai andando vai andando, é tardezinha há até uma certa euforia, um vínculo entre você e aquela extensão...De início parece areira, brilha um pouco, vai anoitecendo..."
Imagem sobre o trabalho de Saveria Vicarini
relato de uma inspiração ofegante
Soprou o vento
guardanapos sobre a mesa
rezei pra poder
pegar a festa
a seresta desta noite
xadrez
não reisisti
peguei um e saí
deixei-te a olhar
os guardanapos
no chão
o olho irmão vago
te atraiçoou a minha saída
um poema vale uma fuga
guardanapos sobre a mesa
rezei pra poder
pegar a festa
a seresta desta noite
xadrez
não reisisti
peguei um e saí
deixei-te a olhar
os guardanapos
no chão
o olho irmão vago
te atraiçoou a minha saída
um poema vale uma fuga
César Félix
Resposta espelhada
Quem é você
que me olha
assim de
modo tão inquisitor?
Que me perscruta o íntimo
quando na verdade
quer conhecer a si próprio?
Não pergunte para mim
as respostas
que estão dentro
de você
eu sou apenas
uma pálida imagem
refletida
daquilo que você
gostaria de ver
Eduardo Bermoso Neto (em uma mesa de bar à beira-mar)
Acima imagem de Letícia Cardoso-"gotas"
3/06/2007
Cadeados
Te trago na palma da mão
Me sobraram dessas linhas todas
uma caixa de objetos
quase sem vida
Me sobraram
alguns restos-papelão
um gesto avulso
uma garganta inflamada
e estas dores internas
Na caixa da minha garagem
têm um guarnapo
com uma promessa efêmera
a culpa de um fracasso quebrado
as lagrimas secas
e as penas de mandar embora
o pó dessa última história
Onde me crio
Onde a jaula do meu leão
Se rompe
Onde corro uma fenda
Na perna,
quase sempre
só me restam
rostos-vapor
vozes-tumores
que a memória me cadeou
Há guardado no papeleão
Da minha garagem
Uma janela quebrada
Um cano furado
E uma lâmpada lascada
Há na garagem de mim
Caixas abertas
varais enozados
E perdas de tempo
Há cavado na minha unha
As sujeiras e os apreços
a covardia impregnada
nas portas erradas
que eu insisti em escancarar
para ver a visita de perto
Nos fundos desse porão cadeado
acasos risonhos desta incansável
vida de horas mortas
Que por mais dolorida a lembrança
cadeei e encadeei
e o tempo de vida
não me libertou
Me sobraram dessas linhas todas
uma caixa de objetos
quase sem vida
Me sobraram
alguns restos-papelão
um gesto avulso
uma garganta inflamada
e estas dores internas
Na caixa da minha garagem
têm um guarnapo
com uma promessa efêmera
a culpa de um fracasso quebrado
as lagrimas secas
e as penas de mandar embora
o pó dessa última história
Onde me crio
Onde a jaula do meu leão
Se rompe
Onde corro uma fenda
Na perna,
quase sempre
só me restam
rostos-vapor
vozes-tumores
que a memória me cadeou
Há guardado no papeleão
Da minha garagem
Uma janela quebrada
Um cano furado
E uma lâmpada lascada
Há na garagem de mim
Caixas abertas
varais enozados
E perdas de tempo
Há cavado na minha unha
As sujeiras e os apreços
a covardia impregnada
nas portas erradas
que eu insisti em escancarar
para ver a visita de perto
Nos fundos desse porão cadeado
acasos risonhos desta incansável
vida de horas mortas
Que por mais dolorida a lembrança
cadeei e encadeei
e o tempo de vida
não me libertou
Cadeados
Te trago na palma da mão
Me sobraram dessas linhas todas
uma caixa de objetos
quase sem vida
Me sobraram alguns
restos-papelão
um gesto avulso
uma garganta inflamada
e estas dores
internas
Na caixa da minha garagem
têm um guarnapo
com uma promessa efêmera
a culpa de um fracasso
quebrado
as lagrimas secas
e as penas
de mandar embora
o pó dessa última história
Onde me crio
Onde a jaula do meu leão
Se rompe
Onde corro uma fenda
Na perna,
quase sempre só me restam
rostos-vapor
vozes-tumores
que a memória me cadeou
Há guardado no papeleão
Da minha garagem
Uma janela quebrada
Um cano furado
E uma lâmpada lascada
Há na garagem de mim
Caixas abertas varais enozados
E perdas de tempo
Há cavado na minha unha
As sujeiras e os apreços
Há a covardia impregnada
nas portas erradas
que eu insisti em escancarar
para ver a visita de perto
Há nos fundos desse porão cadeado
acasos risonhos desta incansável
vida de horas mortas
Que por mais dolorida a lembrança
cadeei e encadeei
e o tempo de vida
não me libertou
Me sobraram dessas linhas todas
uma caixa de objetos
quase sem vida
Me sobraram alguns
restos-papelão
um gesto avulso
uma garganta inflamada
e estas dores
internas
Na caixa da minha garagem
têm um guarnapo
com uma promessa efêmera
a culpa de um fracasso
quebrado
as lagrimas secas
e as penas
de mandar embora
o pó dessa última história
Onde me crio
Onde a jaula do meu leão
Se rompe
Onde corro uma fenda
Na perna,
quase sempre só me restam
rostos-vapor
vozes-tumores
que a memória me cadeou
Há guardado no papeleão
Da minha garagem
Uma janela quebrada
Um cano furado
E uma lâmpada lascada
Há na garagem de mim
Caixas abertas varais enozados
E perdas de tempo
Há cavado na minha unha
As sujeiras e os apreços
Há a covardia impregnada
nas portas erradas
que eu insisti em escancarar
para ver a visita de perto
Há nos fundos desse porão cadeado
acasos risonhos desta incansável
vida de horas mortas
Que por mais dolorida a lembrança
cadeei e encadeei
e o tempo de vida
não me libertou
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