6/11/2007

Reconfissão






Posso ficar um pouco aqui para sempre?Aqui, grudada nesta cadeira com o estômago vazio?Você me perdoaria?Parece que estou presa na cadeira até terminar de pensar. Você me amaria mesmo eu sendo a ferida que mais te arde?Você me perdoaria se eu desse as costas enquanto você fala uma palavra em florescência?Você seria capaz de ver que apesar de te cortar, meu infinito por você é maior?Você aceitaria saber que o que tenho para você, é de rara beleza cristalina e que está atrás de colinas entre arbustos árvores e folhagens, e que eu me aventuro poucas vezes para não perder a essência do sagrado entre nós? Você deixaria eu ir embora sem sentir vontade de voltar?Você entenderia que vivo a transbordar pelos cantos e que explôdo inconsciente?Que não consigo segurar o murro, quando ele me brota?Você pode me aceitar em pedaços?Em sobras de mim?Em cascas de mim?Você me amaria mesmo assim?Você beijaria aquilo que mais renego me fazer parte?Você seguraria minhas duas mãos e tentaria achar e me salvar do precipício?Princípio. Você e seus dedos de faca.Você e essa nuvem regada de tempestade, o seu regador é contínuo, é forte, não cai. Você rega o ferrão. Você alvoroça a primeira carniça livre das amarras. Você prende os pássaros e ata com laços de fita de cetim lilás o bico do passarinho. Você fica olhando o sofrimento e se vangloriando de não ser você o recorte da morte. Você é cheio de escárnio no pensamento. Você brota mau cheiro e enterra a semente no barro seco de uma estrada sem passagem.Você trama, você grita, pede socorro, mas não consegue atender a mudança esmurrando incansavelmente sua porta de entrada. Você foge dos sorrisos mancos.Você não aceita meu sorriso escancarado porque ele é cariado e desinibido.Você quer ver onde estão minhas obturações?Você ainda consegue rir junto ao meu riso doente de expectativas? Eu queria ir sem a culpa de te despedaçar.
Posso também não ir embora. Vou voltar a te confessar isso. Você perdoaria meu silêncio?Você aceitaria minhas raivas espontâneas com o mundo, e minhas pequenas risadas sem limites de expressão?Você está vendo que no meu sorriso sobram cáries?Cáries de discórdia.Você afagaria meu rosto e me ofereceria o peito mesmo eu tendo quebrado seu plano mais promissor?Você me ofereceria um copo d'água e um abraço caloroso mesmo eu sendo condenado ä prisão perpétua?Por um crime hediondo?Eu queria ser clara e límpida como a água de um riacho que corre, corre, sem desespero ou revolta, sem alvoroço de chegada. Mas sou do lodo e do líquido, do delimite entre gasoso e líquido, sou porosa, penugenta e medrosa. Sou sem fim. Você aceitaria minha não certeza?Minha não absoluta certeza?Você aceitaria meu muro de areia movediça?Você ainda me amaria em sua cama, mesmo eu tendo explorado seu último e único centavo?Mesmo eu deixando as dívidas da minha família para você pagar?Você me amaria como no fim de nós dois?Você me perdoaria se eu revelasse que o meu desejo maior só se entrega a você quando estou com os braços presos e os olhos com dúvida?Você passaria os dedos entre minhas pernas mesmo que eu te desmoralizasse no seu bairro inteiro? E diante toda sua Cidade?Você possuiria ainda amor por mim?Você me desejaria se eu cuspisse em suas jóias, arrancasse suas vestimentas e fios de prata e despisse sua ironia a la uísque?Você aceitaria me penetrar olhando em meus olhos mesmo não me querendo para sempre?Você se despiria também de seus deveres e caçaria borboletas comigo, mesmo eu pondo o pé para você tropeçar?Eu matei uma esperança, você ainda me ama?

Você aceitaria que eu vim de um fracasso muito fundo?Daqueles em que se vive o brilho e a fenda.?Desses fracassos que ficam expostos a olho nu, sem remédio aparente. Desses fracassos que ficam esperando a cura. Eu ainda não sarei. Você amaria um enfermo de sentimento?Um enfermo de sentido? Você ainda tem raiva de um próprio passado?Alguém já te bateu em hematomas azulados por dentro? Alguém já te abalou e você ainda dança em cascas de banana o tempo todo? Você também tem um nó de lã gasta e fios embolados como eu? Você me perdoaria se soubesse que quando você me renegou eu te desejei a infelicidade suprema?Sim, eu desejei que você nunca mais fosse feliz. E que quando eu saí da sua vida tinha tanta certeza que não queria mais ver o seu olhar e nem a cor da sua pele, e que hoje eu daria o mundo para passar a mão no seu rosto, mesmo que você já estivesse com os olhos fechados. Eu ainda queria me ver marcada na suas costas. Você ainda me amaria? Você ainda sentiria o mesmo sentido de muitos anos atrás? Mesmo eu sendo este estorvo que ainda almeja o ontem?
Sabe, que muito tempo eu quis a frente, o depois, o futuro e daí eu não soube rir mais do que maldizer. Você me perdoa esse amor que roeu? Essa raiva em blocos que eu te jogava no ar, que eu te pesava as ventanias?Você também errou?Você ainda acha meu pior defeito apenas engraçado?Eu não encanto mais você?Você ainda encanta a mim.Você ainda quer me ver sorrir?Você deseja que eu seja realmente feliz?Você sorri como antes?Com a mesma doçura e pureza? Quem é você?





foto: mtfoliveira.blogspot.com

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